Para comemorar o início do Festival de Cannes de 2018, deixo a minha crítica para o único filme brasileiro a ganhar a Palma de Ouro, prêmio de maior prestígio do festival.
O galã mais vitorioso do cinema nacional
É curioso e ao mesmo tempo estranho, pensar que o diretor
que ganhou o prêmio mais importante do cinema brasileiro, tenha sido um dos
maiores galãs que o cinema nacional já viu. Anselmo Duarte conseguiu essa
façanha com o filme “O Pagador de Promessas”, no Festival de Cannes, em 1962.
Estrelando inúmeros filmes da extinta produtora “Atlântida”,
Anselmo Duarte ficou conhecido primeiramente como um ator que arrancava
suspiros de garotas por onde passava.
A estrela fazia tanto sucesso que quando foi contratado pela
também produtora “Vera Cruz” - famosa na época por ter uma qualidade técnica e
artística impecável - começou a receber o maior salário entre seus colegas de
trabalho.
Só que, apesar de fazer um tremendo sucesso em filmes como
“Carnaval de Fogo” (1949), “Aviso aos Navegantes” (1950), “Tico-Tico no Fubá”
(1952) e “Sinha Moça” (1953), o artista sempre teve curiosidade de ficar atrás
das câmeras.
Assim, não demorou muito para fazer sua estreia como
diretor. Já em 1957, com a comédia romântica “Absolutamente Certo”, Duarte dava
indícios que, embora novo nessa carreira, levava jeito por ter experiência em atuado
em diversos filmes.
O Pagador de Promessas
Apesar de muitos cineastas do cinema novo não concordarem
com isso, é um filme pré-cinema novo. Assistindo ao longa-metragem, você repara
que a obra traz cenários naturais, críticas à sociedade do espetáculo e diferentes
tipos de planos (pequenos, médios e grandes), que futuramente consagrariam essa
nova fase do cinema brasileiro.
Baseado na peça de Dias Gomes, escrita em 1960, “O Pagador
de Promessas” é até hoje o único filme brasileiro a receber uma Palma de Ouro,
o prêmio de maior prestígio do Festival de Cannes.
A temática do filme apesar de ser complexa, não é difícil de
explicar. Acompanhamos o protagonista Zé do Burro (interpretado brilhantemente
por Leonardo Villar), dono de uma propriedade rural que sai de seu lar
carregando uma pesada cruz em seus ombros em direção à Igreja de Santa Bárbara,
localizada na cidade de Salvador. Isso se deve ao fato de seu melhor amigo, um
burro chamado Nicolau ter se machucado gravemente. Tentando de tudo e nada
funcionando para recuperar a saúde do seu amigo, Zé vai até a Iansã do
Candomblé e garante uma pequena parte de sua terra e a promessa de levar a
maior cruz que encontrar até a Igreja de Santa Bárbara, se ela conseguir fazer
que Nicolau se recupere.
Com Nicolau recuperado, Zé do Burro vai em busca de cumprir
com sua palavra. Acompanhado de sua esposa, Rosa (Glória Menezes) ele enfrenta
sol, chuva e o peso da cruz para chegar até Salvador. Chegando na cidade, tudo
ia bem até a escadaria da Igreja. Lá, o protagonista revela ao Padre Olavo
(Dionísio Azevedo) que a promessa foi feita a uma santa do candomblé, o que
causa indignação e revolta ao Padre, impedindo o protagonista de completar a
sua missão.
Dali, Zé do Burro se instala na escadaria até que consiga
levar a cruz para dentro da Igreja.
Proveitoso dizer que o filme poderia se passar nos dias de
hoje, pois mostra a mulher como um ser inferior, a corrupção na Igreja, Deus
como respostas para todas as perguntas e a imprensa sensacionalista – o
repórter querendo transformar Zé do Burro em herói - elementos retratados na
obra e que persistem até os dias atuais.
Anselmo Duarte ainda faz questão de o filme debater sobre o
bem e o mal, a falsidade das pessoas, pois, com exceção do Zé do Burro, todos
os personagens sempre querem algo em troca, mostrando suas duas faces.
Por fim, vale destacar a fotografia do filme. Chick Fowle, famoso
diretor de fotografia da época, ficou responsável por essa tarefa. Cheio de
close-ups e planos gerais - destaque para quando ele retratava a escadaria da Igreja
de Santa Bárbara – o longa-metragem foi influente até nisso.
E nada mais do que justo que “O Pagador de Promessas” tenha
sido eleito em 2015 pela Abraccine, Associação Brasileira de Críticos de
Cinema, como um dos melhores filmes brasileiro de todos os tempos.
Ficha Técnica
Título: O Pagador de Promessas
Ano: 1962
Direção: Anselmo Duarte
Elenco: Leonardo Villar, Glória Menezes, Dionísio Azevedo,
Geraldo Dey Rey.
Gênero: Drama.
Duração: 98min.
~Gustavo Argolo/Gus
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